Mater Ecclesiae, ora pro nobis.
"Perto da cruz de Jesus, permaneciam de pé sua mãe, Maria, mulher de Clopas, e Maria Madalena. Jesus, então, vendo sua mãe e, perto dela, o discípulo a quem amava, disse à sua mãe: "Mulher, eis o teu filho!" Depois disse ao discípulo: "Eis da tua mãe!" E a partir dessa hora, o discípulo a recebeu em sua casa". (João 19: 25-27)
MATER ECCLESIAE |
Portanto, para glória da Virgem e para nosso conforto, proclamamos Maria Santíssima «Mãe da Igreja», isto é, de todo o Povo de Deus, tanto dos fiéis como dos pastores, que lhe chamam Mãe amorosíssima; e queremos que com este título suavíssimo seja a Virgem doravante honrada e invocada por todo o povo cristão. ( Discurso do Papa Paulo VI - 21 de Novembro de 1964)
Maria, Mãe da Igreja
Frei Clarêncio Neotti, OFM
A Igreja sempre venerou Maria como sua mãe. Mesmo porque há uma razão
lógica: ela é a Mãe de Jesus, cabeça da Igreja e a Igreja é o corpo místico de
Cristo, princípio e primogênito de todas as criaturas celestes e terrestres (Ef
1,18). Por isso mesmo, Maria é a mãe de todos os que nasceram pelo Cristo,
tornaram-se irmão de Cristo e em Cristo, e são herdeiros de sua graça, sua vida
e sua glória. Foi, porém, em pleno Concílio Ecumênico Vaticano II, no dia 21 de
novembro de 1964, que o Papa Paulo VI deu solenemente a Maria o título de “Mãe
da Igreja”.
Os Bispos do mundo inteiro acabavam de assinar a Constituição Dogmática
Lumen Gentium, sobre a Igreja, e o Papa acabara de promulgar, em sessão
pública, o novo documento, que implantaria os rumos futuros da eclesiologia e
da prática pastoral. Diferentemente do que se pensara na fase preparatória do
Concílio, os Padres Conciliares não fizeram um documento especial sobre o papel
de Maria na história da salvação, mas inseriram a doutrina mariana, a pessoa de
Maria e sua função como co-redentora, no próprio documento sobre a Igreja,
ressaltando a Mãe de Jesus como membro, tipo e modelo da Igreja.
Maria é vista conexa ao mistério
trinitário, em sua dimensão cristológica, pneumatológica (Espírito Santo) e
eclesiológica. Logo no início do capítulo VIII da Lumen Gentium, intitulado “A
Bem-Aventurada Virgem Maria Mãe de Deus no mistério de Cristo e da Igreja”,
marca-se toda a linha de doutrina: “A Virgem Maria, que na Anunciação do Anjo
recebeu o Verbo de Deus no coração e no corpo e trouxe ao mundo a Vida, é
reconhecida e honrada como verdadeira Mãe de Deus e do Redentor. Em vista dos
méritos de seu Filho, foi redimida de um modo mais sublime e unida a ele por um
vínculo estreito e indissolúvel, é dotada com a missão sublime e a dignidade de
ser a Mãe do Filho de Deus, e por isso filha predileta do Pai e sacrário do
Espírito Santo. Por esse dom de graça exímia supera de muito todas as outras
criaturas celestes e terrestres. Mas, ao mesmo tempo, está unida, na estirpe de
Adão, com todos os homens a serem salvos. Mais ainda: é verdadeiramente a mãe
dos membros (de Cristo), porque cooperou pela caridade para que, na Igreja,
nascessem os fiéis que são membros desta Cabeça. Por causa disso, é saudada
também como membro supereminente e de todo singular da Igreja, como seu tipo e
modelo excelente na fé e caridade. E a Igreja Católica, instruída pelo Espírito
Santo, honra-a com afeto de piedade filial como mãe amantíssima” (n. 53). Este parágrafo contém os pontos
desenvolvidos nessa parte do documento.
Reconheceu o Papa Paulo VI naquele discurso de encerramento da terceira
sessão do Concílio que era a primeira vez que um Concílio Ecumênico apresentava
síntese tão vasta da doutrina católica acerca do lugar que Maria Santíssima
ocupa no mistério de Cristo e da Igreja. E, emocionado, afirmou que queria
consagrar à Virgem Mãe um título que sintetizasse o lugar privilegiado de Maria
na Igreja. E declarou: “Para a glória da Virgem e para o nosso conforto,
proclamamos Maria Santíssima Mãe da Igreja, isto é, de todo o povo de Deus,
tanto dos fiéis quanto dos pastores, que a chamam de Mãe amorosíssima. E
queremos que, com este título suavíssimo, seja a Virgem doravante ainda mais
honrada e invocada por todo o povo cristão”. Alguns anos mais tarde, no dia 15
de março de 1980, o título foi acrescentado à Ladainha Lauretana, logo depois
da invocação “Mãe de Jesus Cristo”.
No mesmo solene discurso, Paulo VI
lembrou que o título não era novo para a piedade dos cristãos, porque desde os
primórdios do Cristianismo Maria foi amada como mãe e o povo sempre recorreu a
ela como um filho recorre à mãe. E argumentou: “Efetivamente, assim como a
maternidade divina é o fundamento da especial relação de Maria com Cristo e da
sua presença na economia da salvação, operada por Cristo Jesus, assim também
constitui essa maternidade o fundamento principal das relações de Maria com a
Igreja, sendo ela Mãe daquele que, desde o primeiro instante de sua encarnação,
uniu a si, como cabeça, o seu corpo místico, que é a Igreja”.
Cito mais um trecho do discurso do Papa em que fala de Maria, imaculada,
sim, mas ligada a nós pecadores por laços estreitíssimos: “Embora na riqueza
das admiráveis prerrogativas, com que Deus a ornou para fazê-la digna Mãe do
Verbo Encarnado, está ela pertíssimo de nós. Filha de Adão como nós e por isso
nossa irmã por laços de natureza, ela é a criatura preservada do pecado
original em vista dos méritos do Salvador; aos privilégios obtidos, junta a
virtude pessoal de uma fé total e exemplar… Nela, toda a Igreja, na sua
incomparável variedade de vida e de obras, acha a forma mais autêntica da
perfeita imitação de Cristo”.
Ninguém, que chega à Praça São Pedro, em Roma, deixa de se impressionar
com a imensa colunata de Bernini, construída em mármore e pedra, como um
grande, afetuoso e festivo abraço de acolhimento aos peregrinos. Por cima da
colunata, 140 estátuas de tamanho natural, de santos e santas nascidos nas mais
diferentes camadas sociais, representam visivelmente a comunhão dos santos, que
não é coisa do passado ou apenas do céu, mas a família viva que se une aos
cristãos que entram na Basílica. Ora, Nossa Senhora não figura entre os santos
da colunata.
O Papa João Paulo II, em 1981, mandou colocar na parte externa e alta da
Secretaria de Estado, que olha para a Praça de São Pedro, a imagem de Maria Mãe
da Igreja. Todos a vêem de qualquer ponto da Praça. Trata-se de uma cópia feita
em mosaico da conhecida como Nossa Senhora da Coluna. Assim chamada, porque seu
original estava pintado numa coluna de mármore da primitiva basílica de São
Pedro. Quando essa foi destruída, em 1607, para dar lugar à grande Basílica
como a temos hoje, a parte da coluna com a imagem foi posta, na nova igreja,
sobre o altar que abriga as relíquias de três papas, os três com o nome de Leão
(II, III e IV), onde está até hoje. Dessa pintura, de autor anônimo, foi feito
o mosaico que agora domina discretamente a Praça. Vestida de azul celeste,
Maria tem nos braços, em gesto de oferecimento ao povo, o Menino que,
sorridente, abençoa com a mão direita, à moda grega. Ambos, Mãe e Filho, olham
para longe, como que contemplando a Praça, a Cidade e o mundo, derramando sobre
todos um olhar de inefável bondade, trazendo à memória a parte final da Lumen
Gentium, onde Maria é considerada sinal de segura esperança e de conforto ao
povo de Deus em peregrinação (n. 68).
Sob a imagem, em grandes letras de bronze, legíveis da Praça, está escrito:
“Mater Ecclesiæ” (Mãe da Igreja).
Paulo VI, que dera a Maria o título oficial de “Mãe da Igreja”,
desenvolveu o tema na Exortação Apostólica sobre o Culto à Virgem Maria, um dos
documentos mais bonitos de seu pontificado. O Papa apresenta, através das
festas marianas do calendário litúrgico, Maria como modelo da Igreja, e pede
que suas considerações de ordem bíblica, litúrgica, ecumênica e antropológica
sejam levadas em conta na orientação da piedade popular e na elaboração das
novas orações marianas (n. 29). O Papa fala de Maria como modelo de quem sabe
ouvir e acolher a Palavra de Deus com fé. Esta é uma missão específica da
Igreja: escutar, acolher, proclamar, venerar e distribuir a Palavra de Deus
como pão de vida (n. 17). Fala de Maria como modelo de pessoa orante e intercessora. Ora, a Igreja todos os dias
apresenta ao Pai as necessidades de seus filhos, louva sem cessar o Senhor e
intercede pela salvação do mundo (n. 18). Fala de Maria Virgem e Mãe, modelo da
fecundidade da virgem-Igreja, que se torna mãe, porque, pelo batismo, gera os
filhos concebidos pela ação do Espírito Santo (n. 19). Fala de Maria, que
oferece ao Pai o Verbo encarnado, sobretudo aos pés da Cruz, onde ela se
associou como mãe ao sacrifício redentor do filho. Diariamente a Igreja oferece
o sacrifício eucarístico, memorial da morte e ressurreição de Jesus (n. 20).
Quando falamos de Maria como modelo, há o perigo de vê-la longínqua, ou
ao menos fora de nós, como vemos os nossos heróis. Na verdade, Maria é parte
essencial da Igreja. Podemos dizer que a Igreja está dentro de Maria e Maria
está dentro da Igreja. Essa verdade foi acentuada, sobretudo, pelo Papa João
Paulo II na encíclica Redemptoris Mater, que leva o sugestivo título: A
Bem-aventurada Virgem Maria na vida da Igreja que está a caminho: “Existe uma
correspondência singular entre o momento da Encarnação do Verbo e o momento do
nascimento da Igreja. E a pessoa que une esses dois momentos é Maria: Maria em
Nazaré e Maria no Cenáculo de Jerusalém” (n. 24). Depois de acentuar Maria no
centro da vida da Igreja, conclui o Papa: “A Virgem Maria está constantemente
presente na caminhada de fé do Povo de Deus” (n. 35). “A Igreja mantém em toda
a sua vida, uma ligação com a Mãe de Deus que abraça, no mistério salvífico, o
passado, o presente e o futuro; e venera-a como Mãe da humanidade” (n. 47).
MARIA – MÃE DE CRISTO
MÃE DA IGREJA (2)
963. Depois de termos falado do papel da Virgem Maria no mistério de Cristo e do Espírito, é conveniente considerarmos agora o seu lugar no mistério da Igreja. «Efectivamente, a Virgem Maria [...] é reconhecida e honrada como verdadeira Mãe de Deus e do Redentor [...]. Ao mesmo tempo, porém, é verdadeiramente "Mãe dos membros (de Cristo) [...], porque cooperou com o seu amor para que na Igreja nascessem os fiéis, membros daquela Cabeça"» (525). «Maria, [...] Mãe de Cristo e Mãe da Igreja» (526).
I. A maternidade de Maria em relação à Igreja
INTEIRAMENTE UNIDA A SEU FILHO...
964. O papel de Maria em relação à Igreja é inseparável da sua união com Cristo e decorre dela directamente. «Esta associação de Maria com o Filho na obra da salvação, manifesta-se desde a concepção virginal de Cristo até à sua morte» (527). Mas é particularmente manifesta na hora da sua paixão:
«A Bem-aventurada Virgem avançou na peregrinação de fé, e manteve fielmente a sua união como Filho até à Cruz, junto da qual esteve de pé, não sem um desígnio divino; padeceu acerbamente com o seu Filho único e associou-se com coração de mãe ao seu sacrifício, consentindo amorosamente na imolação da vítima que d'Ela nascera; e, por fim, foi dada por mãe ao discípulo pelo próprio Jesus Cristo, agonizante na Cruz, com estas palavras: "Mulher, eis aí o teu filho"(Jo 19, 26-27)» (528).
965. Depois da Ascensão do seu Filho, Maria «assistiu com suas orações aos começos da Igreja» (529). E, reunida com os Apóstolos e algumas mulheres, vemos «Maria implorando com as suas orações o dom daquele Espírito, que já na Anunciação a cobrira com a Sua sombra» (530).
... TAMBÉM NA SUA ASSUNÇÃO...
966. «Finalmente, a Virgem Imaculada, preservada imune de toda a mancha da culpa original, terminado o curso da vida terrena, foi elevada ao céu em corpo e alma e exaltada pelo Senhor como rainha, para assim se conformar mais plenamente com o seu Filho, Senhor dos senhores e vencedor do pecado e da morte» (529). A Assunção da santíssima Virgem é uma singular participação na ressurreição do seu Filho e uma antecipação da ressurreição dos outros cristãos:
«No teu parto guardaste a virgindade e na tua dormição não abandonaste a mundo, ó Mãe de Deus: alcançaste a fonte da vida. Tu que concebeste o Deus vivo e que, pelas tuas orações, hás-de livrar as nossas almas da morte» (532).
... ELA É NOSSA MÃE NA ORDEM DA GRAÇA
967. Pela sua plena adesão à vontade do Pai, à obra redentora do Filho e a todas as moções do Espírito Santo, a Virgem Maria é para a Igreja o modelo da fé e da caridade. Por isso, ela é «membro eminente e inteiramente singular da Igreja» (533) e constitui mesmo «a realização exemplar»,o typus, da Igreja (534).
968. Mas o seu papel em relação à Igreja e a toda a humanidade vai ainda mais longe. Ela «cooperou de modo inteiramente singular, com a sua fé, a sua esperança e a sua ardente caridade, na obra do Salvador, para restaurar nas almas a vida sobrenatural. É, por essa razão, nossa Mãe, na ordem da graça» (535).
969. «Esta maternidade de Maria na economia da graça perdura sem interrupção, desde o consentimento, que fielmente deu na anunciação e que manteve inabalável junto da Cruz, até à consumação perpétua de todos os eleitos. De facto, depois de elevada ao céu, não abandonou esta missão salvadora, mas, com a sua multiforme intercessão, continua a alcançar-nos os dons da salvação eterna [...]. Por isso, a Virgem é invocada na Igreja com os títulos de advogada, auxiliadora, socorro e medianeira» (536).
970. «Mas a função maternal de Maria para com os homens, de modo algum ofusca ou diminui a mediação única de Cristo, mas antes manifesta a sua eficácia. Com efeito, todo o influxo salutar da Virgem santíssima [...] deriva da abundância dos méritos de Cristo, funda-se na sua mediação e dela depende inteiramente, haurindo aí toda a sua eficácia» (537). «Efectivamente, nenhuma criatura pode ser equiparada ao Verbo Encarnado e Redentor; mas, assim como o sacerdócio de Cristo é participado de diversos modos pelos ministros e pelo povo fiel, e assim como a bondade de Deus, sendo uma só, se difunde variamente pelos seres criados, assim também a mediação única do Redentor não exclui, antes suscita nas criaturas, uma cooperação variada, que participa dessa fonte única» (538).
Notas:
(1) A História do Mosaico "Mater Ecclesiae":
a - Angelus - João Paulo II - 8 de dezembro de 1981
b - A História do Mosaico de Maria, Mater Ecclesiae
(2) - Catecismo da Igreja Católica: 963-970.
a - Angelus - João Paulo II - 8 de dezembro de 1981
b - A História do Mosaico de Maria, Mater Ecclesiae
(2) - Catecismo da Igreja Católica: 963-970.
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